Endossado
Lucas Selau
Faz algum tempo que não recebo ajuda do meu cérebro. Não há sinapse. Informação alguma
para o corpo. Então vegeto sobre a imagem. Caduco sobre o quadro que fora
pintado antes. Quando ainda controlava os membros, azul e vermelho,
misturaram-se, pernas e braços. Podre de mim, eu pensaria, mas não há cérebro.
Pode
ser que tenha algo a ver com a temperatura da sala. As janelas fechadas há
horas e mais horas seguidas dessa música infernal. Por isso o cérebro se
recusa. Ele suspira. A luz do dia negada. A rara água dedicada à deserta
língua. Deserta em palavras, da introspecção de mim.
Ainda
sim cravado do meu sorriso. Irônico eu. Da minha desgraça a minha graça, minha
sabedoria mundana. O que é tão engraçado na mistura ébria das cores na tela? Há
quantos relógios daqui viverá minha experiência, afinal, as doses de flashes me
desafiam a destilar sensações distintas... Com isso a revolta das conclusões.
Navegando, súditas, minha cabeça. A confusão do que seria a realidade enfim.
No
começo tinha a tela por completo em mãos. Vi o primeiro choque entre tecido e
tinta. Vi último beijo entre detalhe e pintor... Quiçá, eu destilando as mil
cores em um só tom. Mas cansava, e a cada piscada me misturava em incertezas:
de como seria dado aquele toque, ou qual a cor dos lábios da persona. Não
tivera a certeza na hora certa, e talvez por isso, agora afogo em inanimado.
Pois
era manhã quando a porta, aberta por alguém ou abrindo com uma lufada de vento,
soslaiou lucidez. Transcorreu um tremor em meus músculos. Arrepios. Foi quando
minha mão se fechou, retesada contra pincel e tinta seca. O sorriso, tatuado,
apagando-se aos poucos. Meu corpo podendo ficar sentado. Minha cabeça
eletrocutando novamente minhas ações, pouco a pouco. E meus olhos...
Os
fechei alguns instantes. Um momento. Segundos, eu creio. Misturei sal sob
pálpebra e deixei tudo acalmar no mar em íris. Não aguentava lembrar o silêncio
da noite. Nem lembrar a penumbra e a imagem pintada. Nem a respiração e as
sensações distintas em tantos níveis aleatórios. Só descansei minha visão.
Abri-os,
tanto olhos quanto sorriso. Meu quarto escuro. Minhas mãos limpas. Meus pinceis
intactos, Meu quadro branco.
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